quinta-feira, 24 de novembro de 2005

Ele sabia

Ele sabia que "o sonho é uma constante da vida" e que até "comanda a vida".
É a actualidade do conhecimento da vida e da natureza humana que nem todos conseguem agarrar, ou mesmo tocar. Os versos do homem das letras e das Físicas e das Químicas tornaram-se farol desta amostra de humanidade à beira Atlântico nascida.
António Gedeão, para uns, Rómulo de Carvalho, para outros, nasceu a 24 de Novembro de 1906 em Lisboa, a capital do Reino.
Os seus versos são também versos de alguém que olha a vida com olhos de ver barcos a baloiçarem no Tejo, para lá e para cá.

Vou-me até à Outra Banda
no barquinho da carreira.
Faz que anda mas não anda;
parece de brincadeira.
Planta-se o homem no leme.
Tudo ginga, range e treme.
Bufa o vapor na caldeira.
Um menino solta um grito;
assustou-se com o apito
do barquinho da carreira.
Todo ancho, tremelica
como um boneco de corda.
Nem sei se vai ou se fica.
Só se vê que tremelica
e oscila de borda a borda.

(continua aqui)
Os seus versos são versos de alguém que sabe ver pessoas, para lá da cor da pele e outros sinais exteriores de humanidade que o mundo injustiça. Isto é: outra espécie de humanidade rejeita e ignora. Às vezes, pior!

Encontrei uma preta
que estava a chorar,
pedi-lhe uma lágrima
para a analisar.

Recolhi a lágrima
com todo o cuidado
num tubo de ensaio
bem esterilizado.

Olhei-a de um lado,
do outro e de frente:
tinha um ar de gota
muito transparente.

Mandei vir os ácidos,
as bases e os sais,
as drogas usadas
em casos que tais.

Ensaiei a frio,
experimentei ao lume,
de todas as vezes
deu-me o que é costume:

nem sinais de negro,
nem vestígios de ódio.
Agua (quase tudo)
e cloreto de sódio.


António Gedeão foi poeta e professor do Ensino Secundário. Há uma escola com o seu nome de poeta. Há livros de poesia de António Gedeão e há manuais escolares de Físico-Química de Rómulo de Carvalho.

Eles não sabem...

7 comentários:

Anónimo disse...

E há a minha rua!!Pois é, tenho o privilégio de morar na rua António Gedeão.Só é pena que seja uma pequena rua dum pequeno bairro,porque ele merecia uma grande avenida ladeada por acácias...
um grande beijinho
ana

Carlos Gil disse...

... sempre lindo...

Anónimo disse...

Encontrei no google:

Eu sou um professor!?

Professor
Havia harmonia no caos
Na confusão todos se entendiam
Sem olhares, sem palavras, todos apenas e só apenas sentiam. Uma sensação única.
Mãos desencontradas, faces atribuladas, corpos frágeis, magros, negros, pardos.
Um vazio...
Dependentes da angústia.
Solidão coletiva, aglutinação de impotência
Medos...
Uns resmungam, outros calam, tremem, teme,
Outros já nem sentem
Os sonhos se vão...
Se foram se é que existiram.
Choro solitário da experiência de todos
Dor...
Sem rumo seguem, vão num olhar robótico,
Abrem mais uma página, desfolham, rasgam-se, matam-se.
Aos poucos todos,
Aos poucos,
Uns loucos
Um poucos
Mas calam...
Seguem...
Revivem se exasperam, sofrem, não há a quem apelar.
A alma pena, os corpos que pelos anos se mutilam se marcam.
Por fora, por dentro.
Por atos , por omissão,
Por tudo, por nada.
Rostos enrugados,
Bocas e mãos secas, mentes sedentas. Ainda sonham
Efêmero êxtase
Haverá um amanhã?
O hoje não lhes permite.
Sonhos.
Preces mudas.
Impedidos de ser
Rebuscam o não ser,
Crendo...
Fingem que são.
Sentem-se mais fortes.
Para seguir não sendo.

Gleise Costa e Douglas Costa

Formiga Rabiga disse...

Tenho livros dele, deles ai, dele, cá em casa : )

Anónimo disse...

Gedeão e Reinaldo Ferreira, os dois primeiros livros de Poesia que tive! - um beijo, Madalena!, IO.

Pitucha disse...

Homem fantástico.
Beijos Madalena.

Madalena disse...

Ana, uma rua com o nome de poesia sabe bem . Eu também moro numa rua com nome de poesia: é um poeta de cá e curiosamente sou amiga da sobrinha!
Carlos, obrigada pela visita. Os poetas andam na ordem do dia, não é?
Laura, comoveu-me o teu gesto. Obrigada do coração!
Formiga, eu imaginava que tivesses. Parabéns aqui também pelo aniversário.
Chuinguita, Reinaldo Ferreira foi o meu primeiro livro de poemas. Dado pelo meu pai que o conheceu.
Pitucha, deve ter sido, pelo que sei da sua vida.
Beijinhos a todos!