segunda-feira, 12 de dezembro de 2005

Natal e não Dezembro

Entremos, apressados, friorentos,
numa gruta, no bojo de um navio,
num presépio, num prédio, num presídio,
no prédio que amanhã for demolido...
Entremos, inseguros, mas entremos.
Entremos, e depressa, em qualquer sítio,
porque esta noite chama-se Dezembro,
porque sofremos, porque temos frio.


Entremos, dois a dois: somos duzentos,
duzentos mil, doze milhões de nada.
Procuremos o rastro de uma casa,
a cave, a gruta, o sulco de uma nave...
Entremos, despojados, mas entremos.
Das mãos dadas talvez o fogo nasça,
talvez seja Natal e não Dezembro,
talvez universal a consoada.

David Mourão-Ferreira

A palavra do poeta David Mourão Ferreira remete-me para um tempo em que tudo era diferente. Eu, sobretudo, era diferente! Sobrava-me juventude; faltava-me experiência. Sobrava-me futuro, mas eu não sabia; faltava-me passado, mas eu também não sabia.
Eu nem sequer sabia ainda que aquele senhor de cachimbo era quem hoje é!
Como hoje este poema é o mesmo poema, que fala do mesmo natal, que fala do mesmo frio de Dezembro e da mesma esperança universal na universal consoada!
neve
Como este quadro consegue guardar para sempre uma paisagem que eu nunca vi, senão aqui. Contudo, parece que sempre conheci esta paisagem que associo ao mês de Dezembro.
Talvez seja Dezembro!
Talvez seja Natal!

1 comentário:

Anónimo disse...

Mana: quando comecei a ler o poema, ouvi-o com a voz do Manuel Alegre. Oxalá o David M.F. me perdoe... É tão bonito! Consoemos pois todos os dias, com poemas como pratos principais. Que a nossa gula seja desmedida e jorrem versos nas casa dos demais! Que bom poder ter-te sempre à minha mesa!