terça-feira, 24 de julho de 2007

A minha cidade

No mais fundo de mim, eu sei que te traí, minha cidade!
É no verso de Eugénio de Andrade que vou encontrar a explicação deste remorso que me dói.
O meu pensamento apaixonou-se pela ideia de uma metrópole cheia de chique e de classe, onde, pensava eu, nascia a cultura, a filosofia, o conhecimento...
Enfim tudo aquilo que eu achava que preencheria a minha ignorância e me tornaria, finalmente, uma pessoa feliz.
Durante um ano esmaguei a saudade.
Ao fim de dois anos, voltei, num 24 de Julho também, e a minha cidade estranhou-me e eu estranhei-a a ela.
Já não éramos as mesmas: nem ela, nem eu!
Passaram trinta e cinco anos. As magias do mundo moderno trouxeram-me de volta a minha cidade.
E o desejo de um dia tornar a encontrar-me com a minha cidade.
E esse dia há-de chegar, para um reencontro feliz com o passado. Será um tempo de sarar feridas, de me reconciliar com as origens, de reconhecer a minha cidade. De lhe tocar com os sentidos todos. Levo comigo os trinta e cinco anos de mim.

A avenida que celebra a data.
Fotografia daqui.E, para acabar como comecei, parasitando a inspiração do poeta:
"Eu vou com as acácias!"

6 comentários:

Anónimo disse...

Sem dúvida alguma, das avenidas que rasgam a cidade, esta é a mais bonita. Olá 24 de Julho!, a rua que tantas vezes fiz para ir para o liceu.

Um beijo, IO.

Nelson Reprezas disse...

Salvaguardadas as dimensões eu tenho um fraquinho pela Kenneth Kaunda, Nossa Senhora de Fátima antes da independência. Nunca me esquecerei do cenário disponível para quem desce, com o mar ao fundo, enquadrado pelas palmeiras e pela relva do jardim central...
Mas há uma razão extra. É que nem tu nem provavelmente a IO terão conhecido a 24 de Julho no estado actual. Esta parte que tu mostras na foto está em boas condições mas eu diria que depois do cruzamento com a Vladimir Lenine a avenida está muito degradada. E eu já a conheci degradada e talvez isso tenha ajudado a eu gostar mais da KK.
Beijinho

miguel disse...

que texto tão bonito e comovente.
bjs
miguel (innersmile)

Anónimo disse...

A minha cidade não é esta. A minha cidade também tem acácias, muitas... é a cidade da Beira.
Estou sempre na "Esperança" de , também, um dia poder voltar.
Gostei de ler.

Carlos Gil disse...

entendo-te perfeitamente. aliás, sinto o mesmo. sinto que traí sem ter traído - a vida 'forçou-o'.
tenho medo em regressar. de andar feito tonto por ruas que não reconheço, à procura de locais que já só existem na minha memória. de, afinal, a 'minha cidade' ter mudado tanto que eu serei um morto-vivo vagueando em memórias.
não é só a falta de pilim que fez que ainda não lá voltasse. é este 'medo', medo de mim, medo dos olhos molhados em nostalgia.
grande, enorme beijo. pode ser do tamanho da 24 de Julho?
:-)

Madalena disse...

Um beijo enorme a todos que confortaram a minha culpa. Chega um dia em que sai a verdade, mesmo que esteja guardado no porão da memória. Obrigada, IO, Espumante,Miguel Alda e Carlos. Um ramo de acácias orvalhadas do mais puro cacimbo!!! O abraço e o beijo da cidade linda!