(Nem eu me portei exemplarmente bem! Por muito que conviesse dizer agora o contrário. Acho mesmo que a minha entrada no céu pode estar barrada, por algumas coisas que fiz no Colégio. Mas como tive o castigo, levei as reguadas e fui ameaçada com o inferno, talvez me tenha sido relevada a culpa!)
Recordo-me que uma das razões para que a maioria de nós excluísse dos sonhos do futuro a profissão de professor era, exactamente, a de poder vir a sofrer os desgostos que nós mesmos infligíamos aos nossos professores.
Claro que nunca ameaçámos nenhum professor! Claro que nunca proferimos obscenidades! Claro que nunca nos atrevemos a gritar palavras de ordem da alma para fora. No entanto, cá dentro, no segredo do nosso pensamento e do nosso desejo, as coisas aconteceram com a violência que hoje a televisão escancara. Havia então ainda aquilo a que chamamos respeito que, na tenra idade, só existe mesmo condicionado pelo medo. Nem todo o medo é mau, nem todo o respeito é bom. Se depois a maturidade não se desenvolvesse de forma a prometer ao corpo e ao pensamento bons momentos de felicidade, o ser, o indivíduo podia mesmo dar para o torto.
Aquelas crianças manifestaram-se frente a uma objectiva que lhes prometeu uma fama, que eles não sabem que não é eterna e muito menos sólida. Eles recrearam-se, à sua bela vontade, como fazem no recreio da escola, longe das câmaras de televisão, com os naturais instintos de rebeldia estimulados e acrescidos. Eles deitaram cá para fora o que está lá dentro a estragar-lhes a infância... (Já o José Gomes Ferreira falava de infância estragada!)
É preciso é que os Senhores e as Senhoras acreditem que não foi preciso nenhum professor dizer-lhes para se portarem mal, para atirarem ovos aos elementos do governo. Eles fazem isso tudo na escola. Sim também atiram ovos e fazem até coisas piores. Os senhores, é que ainda não tinham dado por isso! Agora deram e dizem que fomos nós que os mandámos, que os instrumentalizámos.
Era tão bom se eles fizessem tudo o que nós dizemos para fazerem?!
“Entusiasmava-me naquele momento preciso em que devia entusiasmar-me e, depois de determinadas frases cantaroladas com determinado ardor, batia sempre palmas, num ímpeto de causar trovoada no mundo.
E todos, em redor de mim, faziam o mesmo.” José Gomes Ferreira, O Mundo dos Outros

Sem comentários:
Enviar um comentário