quarta-feira, 4 de junho de 2014

Hoje será sempre o dia dos teus anos, papá!

"Hoje será sempre o dia dos teus anos, papá!"
Foi o que eu escrevi no Facebook, hoje, pela manhã. Não porque seja necessário fazê-lo, para me lembrar de ti, para sentir que tu continuas a andar por aqui. Continuas porque os genes assim o ditam e, contra a ciência, nada feito! Ela ganha! Esta verdade científica dá-me segurança e não tenho de me refugiar noutros “creres” para ter a certeza da tua presença.
Todos os dias o teu retrato deambula pelas minhas recordações, pela minha própria pessoa pois estou cada vez mais parecida contigo, fisicamente.
Às vezes, é na vida dos outros, é nos momentos que vamos repetindo, no tempo de hoje, que eu te "encontro". Quando vou buscar os meus netos à escolinha, por exemplo, recordo o dia em que chegaste mais tarde e a tua figura enorme nunca mais aparecia junto ao portão e eu pensei que esse era o último dia da minha vida. Pois que é que eu podia fazer sem ti ou sem a minha mãe? Quando finalmente chegaste, corri e as tuas pernas eram tão grandes que era difícil o abraço, o colo…. Era preciso trepar.
(Por isso, "aflição" foi coisa que eu quis sempre que os meus filhos não sentissem. E agora com os netos será igual.)
Tu foste sempre um homem grande e a tua altura não era apenas uma altura medida em metros. Tinhas uma visão das coisas da vida muito certa, muito antes de chegarem até nós. Juntavas a esta capacidade de prever, ver ao longe, uma filosofia de vida que se baseva, digo eu, hoje, no mais profundo senso comum. E olha que o senso comum não é qualidade que as pessoas gostem de proclamar! Todos querem ser originais. E tu tinhas umas tantas frases feitas que, sendo ou não da tua autoria, sustentavam a tua verdade sobre a vida. Por exemplo, o ditado “os cães ladram e a caravana passa” era muito inspiradora para ti porque tu sabias (eu ainda não) que devemos seguir os nossos caminhos, independentemente do que os outros acham ou não. Mais ou menos isso.
Eras pessoa de grande conversa e de grande companhia. Os teus interesses eram tão variados que ninguém ficava indiferente ao que dizias. Sabias ouvir e isso era muito importante para mim. Mesmo que não dissesses, eu percebia quando é que tu não gostavas de alguma coisa que eu tivesse dito ou escrito.
Dois ou três dias antes da tua partida (não consigo referir-me por outra palavra que não seja o eufemismo!) falámos de nós, de mim e de ti, os dois, eu e tu,  e eu fiquei muito feliz porque tu me disseste que eu nunca te tinha dado problemas ou desgostos.  Engoli em seco porque sabia que isso não era bem assim, mas também percebi que na altura era o teu sentir: não havia nada nas minhas escolhas, nos meus caminhos, que tivesse de ser severamente censurado.
Foi muito importante teres referido essa paz com que partias e teres-me deixado essa paz que me acompanha sempre.
 A gente vai falando, sim, papá? 

2 comentários:

miguel disse...

gostei tanto deste texto. das minhas memórias, ainda que vagas e imprecisas, infantis, do nosso primeiro encontro, o teu pai faz parte componente. e de certo modo, até agora, ele estava a faltar à nossa reunião.
beijo grande, Madalena

Madalena disse...

Beijinho grande, Miguel!