quarta-feira, 20 de abril de 2005

Efeméride do coração!

Todas as infâncias têm mistérios.
O tempo, normalmente, encarrega-se de explicar alguns.A maior parte das vezes, porque a compreensão do mundo e dos factos torna evidência o que antes era mistério.
Mas há outros que permanecem mistérios.
E este mistério leva-me de novo ao espaço mágico de que já aqui falei várias vezes: a casa da minha avó!
Na altura, eu não sabia dar determinados nomes às coisas, mas hoje percebo que a minha avó era uma verdadeira matriarca.
Tomava conta de tudo e de todos. Sabia tudo de todos. Conhecia-nos, aos dela, como ninguém. Estava sempre em casa e tudo o que acontecia passava por ela, claro!
O meu avô trabalhava fora e, quando estava em casa, embrenhava-se na leitura, ou então, colava o ouvido à telefonia, para ouvir o futebol.
E ai de alguém que lhe interrompesse este prazer!
Era a única situação em que ele se manifestava e nós víamos o caso mal-parado.
Contudo, era só coreografia, porque não acontecia nada e ninguém se zangava. Ele continuava a ouvir o relato e mais nada!
Em dado momento, reparei que o livro que lia era sempre o mesmo: A Cidade e as Serras.
Mais tarde, quando a frequência do Liceu, me exigiu a leitura de romances de Eça de Queirós, Maias, Primo Basílio, o mistério avolumou-se : aquela leituras eram pesadas, carregadas, povoadas de personagens perversas, incesto, adultério, suicídio...
Nada disto me podia sugerir que o livro que o meu avô lia e relia fosse, o que mais tarde entendi, uma homenagem às coisas simples e verdadeiras.
Quando compreendi isso, desfiz o mistério: ele era um homem simples e verdadeiro!
Faria hoje cento e alguns anos!
Há trinta anos, a teimosia levou-o a sair de casa, a pretexto de comprar o jornal, contrariando a vontade da minha avó que já lhe tinha dito que escusava de sair porque não precisava de nada, que tinha tudo em casa...
Ficou desde aí a morar nos nossos corações!
E foi a pensar no meu avô e nesta sua predilecção literária que um dia escrevi e publiquei, na Nova Gazeta, uma recensão de "A Cidade e as Serras".
Está aqui!

8 comentários:

Anónimo disse...

De Roma, um beijo grande para ti, minha amiga.

Anónimo disse...

Já fui fazer a minha reciclagem aos teus restos de colecção!
Fico sempre enternecida com as histórias que contas dos teus avós, porque revejo neles os meus.
Um grande beijinho
ana

Emilia Miranda disse...

Olá Madalena:
Os avós e as memórias que temos deles. O que seria de nós sem todas as belas memórias que deles guardamos?
Um grande abraço,
Emília.

Madalena disse...

Ana, és sempre tão generosa nos teus comentários! Obrigada por essa generosidade!
Gosto muito de recordar os meus avós e aquela casa grande onde sentíamos todos a segurança que precisávamos para crescer.
Eles fizeram de nós o que somos!
Um beijinho grande para ti.

Madalena disse...

Um beijinho para ti, Emília. Hoje estive a ver o projecto com a Teresa. Ela também ficou entusiasmada.
Olá Titas! Ainda em Roma? O mundo tem os olhos postos em Roma!!!
Um beijinho grande também para ti!

Dinamene disse...

Madalena, pelo que vejo, parece-me ter estado em Moçambique. Já viu o filme A Intérprete? Que lhe pareceu?

Madalena disse...

Cê, ainda não vi o filme mas fiquei curiosa e fui espreitar...
Muito interessante! Obrigada pela sugestão! E pela visita!

t-shelf disse...

Ora aí está uma feliz sugestão de leitura.