quarta-feira, 1 de junho de 2005

Dia Internacional do Putos, Pois é!

Há um “puto”, desses do Altino do Tojal, que nunca esqueci, desde o dia em que o encontrei, se não me engano, nas páginas de um manual escolar: o miúdo que juntava chapinhas para partir para a terra dos “maricanos”, no comboio das vinte e duas.
“Tinha cabelos ruivos e olhos azuis” e todas as noites ia até à estação dos Caminhos de Ferro.
putos
Assim que o comboio chegava, tirava o gorro e lá ia pedindo a quem passava uma moedinha para o pãozinho.
Um dia, ou melhor, uma noite, o narrador e o garoto chegaram à fala.
Foi assim que ele explicou entre muitos “Pois é!”, que o dinheiro, ou seja, as chapinhas iam um dia levá-lo até à América do Norte, para onde tinha partido o pai, naquele mesmo comboio. O das vinte e duas, confirmou: “Pois é. No que saiu agorinha mesmo...” O narrador quis saber mais, averiguou o facto da mãe não trabalhar. A resposta foi simples. Ela não trabalhava porque tinha morrido.
E resposta a resposta, todas curtas e simples, lá vamos ficando a saber a vida do miúdo. Vive em casa do Quico, um rapaz que ele lá sabe, e de dia trabalha para a mãe do Quico. Mas só de dia. De noite, trabalha para ele. O contrato de trabalho está bem definido, pelos vistos, e a contabilidade está bem feita: faltam oitenta e quatro chapinhas das brancas para embarcar. Quem lhe disse? O Senhor Vilaça, o homem dos bilhetes, que tal como o narrador não tem coragem de acordar o Mingos do sonho da viagem à terra dos “maricanos”, no mesmo comboio em que o pai embarcou, há catorze anos.
O Mingos tem sete e confia nas contas da mãe.

7 comentários:

Anónimo disse...

É lindo, Madalena. O que não é lindo é que neste já século XXI tenhamos cada vez mais de dizer: ... "mas as crianças, Senhor, porque lhes dais tanta dor, porque padecem assim?..."

Anónimo disse...

LINDÌSSIMO, Madalena!! - um beijo, IO.

Unknown disse...

bonito conto..mas ler e reler a espera de mais muito mais.

lilla mig disse...

Tão bonito e triste...

Dinamene disse...

Eu também li Os Putos às minhas filhas, que gostaram muito. Mas hoje estou virado para as Redacções da Guidinha e quero ver a Madalena rir. «O cavalo é um bicho que tem 4 patas e carroça mas há cavalos que não têm carroça porque fazem corridas e ganham mas quem leva as taças são uns homens pequeninos que andam em cima deles e há os cavalos das touradas e o senhor Francisco que o meu pai diz que é o maior cavalo que ele alguma vez viu e os cavalos dos cow-boys que conhecem os assobios dos donos e salvam-nos quando os índios os estão a matare o D. Afonso Henriques tinha um cavalo porque os reis andavam a cavalo só os presidentes é que não sabem montar (...)»

lique disse...

Fizeste-me lembrar esse livro e apeteceu-me ir relê-lo. Delicioso esse pequeno conto! Que bom era se todas as crianças do mundo pudessem ter um dia feliz!
Beijinhos

Emilia Miranda disse...

Olá Madalena:
Os putos merecem tudo aquilo que lhes pudermos dar, não é verdade?
Um abraço,
Emília.