sábado, 9 de setembro de 2006

Assim tão fácil?

Se eu quiser, mudo a minha escola Daniel Sampaio

Agora é mesmo, as aulas começam para a semana, o Conselho Executivo diz que na próxima sexta tudo tem de estar a funcionar. E eu? Como vou aguentar mais um ano lectivo? Ainda não sei. Às vezes penso que é melhor deixar correr, fazer o mínimo, não ter grandes expectativas nem gastar muitas energias: controlar a disciplina, cumprir o programa, dar-me bem (mas sem grandes intimidades) com os colegas, colaborar (nunca em excesso) com a direcção da escola, dizer umas piadas contra a Ministra (sem elogiar os sindicatos). Uma questão de equilíbrio e bom senso, sou perita nisso. Como já sou um pouco velha, sei defender-me das armadilhas, não me deixo humilhar pelos alunos nem os pais fazem farinha comigo. Respeito as famílias, mas a experiência já me ensinou que muitos dos problemas dos miúdos têm origem em casa, por isso não vale a pena pensar que os vamos resolver de um momento para o outro. Vou apostar mais uma vez num ano tranquilo, farei as greves mas não entrarei em loucuras, nunca vou desistir de ter as aulas a funcionar. Serei Directora de Turma, nunca concordei que sejam professores muito novos a ter esse papel, mas não pensem que farei grandes esforços, uma reunião por período e duas horas por semana, lá para o fim da manhã, chegam para aturar a meia dúzia de pais que lá costuma aparecer, às vezes a mandar vir.
Sei que poderia ser diferente: às vezes, à noite, quando estou sozinha em casa, penso que, se quisesse, era capaz de mudar a escola. E ponho-me a pensar como faria. Era assim: na sala de aula, começava por pedir a cada um dos alunos o que esperava para o ano que agora começa, para que conseguisse chegar às diferentes vias que tenho de utilizar para conseguir uma boa aprendizagem para cada um; depois, punha o grupo a funcionar, a dois a dois ou mesmo todos ao mesmo tempo, para desde o início tirar partido das diferenças e estimular a participação. Não me punha a ler o manual, como cheguei a fazer o ano passado, por preguiça ou medo de perder o controlo da turma: aproveitava novos materiais, sites na Net, recortes, figuras, para tornar a aula diferente em cada dia. Com regras estabelecidas em conjunto, iria ter menos problemas, mas seria firme de início, sem ceder a provocações.
Trazia a Internet para a aula, o que é preciso é ensinar de modo diferente! E na escola em geral? Bem, teria de ser mais activa. Sei que a Educação para a Saúde é agora obrigatória, muitos colegas dizem que não têm condições, mas no fundo sei que há muito a fazer: vou oferecer-me para coordenadora, falar com os pais, arranjar uma caixa de perguntas para os miúdos colocarem as dúvidas, ajudá-los a fazer pesquisa para a Área de Projecto. Não posso fazer de conta que não vejo tantos gordos, ou fingir que desconheço os que fumam "ganzas"!
E não vou fingir que nada tenho a ver com a colega que não impõe a disciplina (no ano passado saía a chorar das aulas). Sempre que puder, vou para junto dela, nada me proíbe de o fazer, em conjunto vamos ser capazes de pôr a sua aula a funcionar. E vou propor mais reuniões do Conselho de Turma, chamar os pais para dizer bem dos filhos, aproveitar a força que eles têm para pressionarmos o ministério a fazer obras.
Vou ficar cansada, é claro, mas tenho a certeza que ficarei menos azeda: é que, francamente, já não suporto aqueles ajuntamentos na Sala dos Professores a dizer mal de tudo, com os alunos cheios de negas e tantos professores à deriva!

Revista XIS, 9 de Setembro de 2006
Revejo-me no retrato traçado na primeira parte desta opinião. Os professores com muitos anos de serviço e, como eu, há muitos, parece já terem adquirido armas de "equilíbrio e bom senso" para enfrentar o ano lectivo sem sofrimentos desnecessários.
Parece até fácil!
Mas, é sozinha em casa que eu vou construir o sonho de mudar a escola? Talvez seja exactamente por isso, por a tentativa, ou as tentativas não passarem de sonhos solitários que isto não muda mesmo. Além disso, o Professor Daniel Sampaio sugere que se adapte o sonho de cada um, e o colectivo de muitos de nós, ao sonho da ministra e da sua política de combate ao insucesso, cedendo cada vez mais armas à ignorância e pela desistência sistemática de ensinar e aprender, efectivamente!Quanto aos novos materiais, recortes e figuras, trabalho de pares, até a Net, são práticas que não vamos inventar porque já as implementámos, apesar dos poucos recursos de que dispomos.
O que não conseguimos mesmo inventar é alunos felizes e professores felizes. Atiçaram uns contra os outros. Atiraram para o meio da confusão os pais, que não são chamados à escola para se lhes dizer apenas mal dos filhos. É provável que queiram ouvir a verdade, seja ela mais ou menos agradável.
Quanto ao azedume, parece-me bem que ele destila directamente dos gabinetes climatizados e embelezados para os operários da educação que trabalham pele a pele com a matéria prima: o aluno!
Fico triste quando leio o Professor Daniel Sampaio. Ele que deve conhecer muito bem a difuculdade que todo o ser humano tem em aguentar desconsiderações! É ele que nos vem chamar azedos?
Não sei por que razão a Ministra, dizem, vai inaugurar simbolicamente o ano lectivo no Montijo, no Agrupamento de Escolas a que pertenço.
Mas como dizem as personagens nos filmes, para que a acção continue a prender a atenção do espectador: Não sei, mas vou descobrir!

2 comentários:

125_azul disse...

Já me cansei de ficar triste com o Prof Daniel... teorias são sempre tão mais simples que as práticas diárias...
Qdo descobrires tudo, contas?
Beijinhos

Anónimo disse...

Essa senhora que vai ao Montijo,que faça o favor de ir à m...a e aproveite para rezar,pois tem os "dias contados",é sempre assim,mais tarde ou mais cedo a verdade vem ao de cima e nós sabemos qual é a verdade...ela ainda anda a ler nos livros.
Beijinhos e Bom início de Ano Lectivo.