segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Os dias que passam

Quando o dia me dói, a minha memória refugia-se no quintal da minha avó, onde as Árvores de Fruto eram Rainhas. As Couves, as Alfaces, as Galinhas e os Coelhos eram súbditos de Suas Majestades que se mantinham de pé uma vida inteira, altivas e resistentes.
Uma das mais pequenas era a romãzeira. Ficava ao fundo, junto aos tanques (onde as mulheres da casa lavavam toda a roupa da casa!) e vigiava os lençóis que ficavam a corar nas imensas redes, ali postas para o efeito. Era das mais franzinas, a romãzeira. Talvez alguma maleita tivesse impedido esta mãe de uma fruta tão sugestivamente real de crescer, crescer, crescer, robustamente, rumo às alturas dos telhados dos vizinhos. Ficava-se, humildemente, pela altura dos muros.
À medida que fomos crescendo, fomos chegando com mais facilidade às romãs. Não tínhamos de esperar que caíssem. E depois, bago a bago, lá íamos saboreando o delicioso fruto, que parecia não ter fim.
Hoje, tenho também uma romãzeira nos meus caminhos. O afecto que sinto por ela vai aumentando à medida que me afasto da outra da minha infância. A vida é assim!(Já não sei se foi a romãzeira que me sussurrou esta verdade?!)Talvez a romãzeira do quintal da minha avó tenha voltado e se tenha plantado ali, quase à minha porta. Sem esta, bem mais definhada mas mesmo assim romãzeira, eu já teria esquecido a outra, penso eu, cheia de culpa. Ninguém deve ser esquecido. Nem uma árvore. Nem uma flor. Nem o doce de um bago de romã!

5 comentários:

Pitucha disse...

Tanto que me apeteceu comer romã, querida Madalena.
Beijos

Nelson Reprezas disse...

O meu avô, que era quem me ensinava as malandrices e os pensamentos de pecado, à revelia do meu irrepreensível pai, disse-me uma vez, à surrelfa, que a romã para ser boa tinha de ser comida com açúcar e vinho tinto (o vinho tinto explica o secretismo da coisa...). Claro que não descansei enquanto não experimentei. O tempo passou e hoje acho muito melhor um texto como teu sobre romãs do que qualquer vinho. Por muito tinto quue seja...
Beijinho
:))

EVISTA disse...

Apesar de não apreciar o fruto, estou como a Pitucha,depois de ler este texto até dá vontade de comer uma.E dizem que traz fortuna a quem a come. Gosto muito da árvore ...quando está em flôr fica tão bonita!
Beijinhos Madalena
M.Dores

calamity jane disse...

Lindo, lindo, Madalena! Lindo mesmo.

Anónimo disse...

cool blog